Renan Ferreira de Araujo(1)
A crise política e econômica no Brasil segue aberta, sem previsão de encerramento. As direitas avançaram nas ruas e nos parlamentos e um golpe institucional se consolidou com o impeachment de Dilma Rousseff, colocando nossa (limitada) democracia em uma encruzilhada. Por isso, as eleições de 2018 ganham uma importância ainda maior e é preciso entender o que está em jogo na disputa.
O pano de fundo deste debate é a necessidade dos super-ricos de se beneficiarem com a crise através do aumento da exploração do trabalho e da aplicação de medidas que retiram direitos sociais e trabalhistas. Um conjunto de candidatos à Presidência da República em 2018, milionários, não estão satisfeitos com a brutal retirada de direitos aplicada até aqui. Querem avançar com a aprovação da reforma da previdência e aprofundar o investimento para quem já está lucrando com a crise – mesmo que isso signifique piorar as condições de vida e privatizar a educação e a saúde.
O setor financeiro, com destaque para os bancos, é o melhor exemplo de quem lucrou com a crise e intervém na política e nas eleições com um projeto de mais exploração a quem trabalha e menos direitos ao conjunto da população. Denunciar isto é uma tarefa anticapitalista de primeira ordem: o projeto dos super-ricos e dos banqueiros não é novo. Querem piorar as condições que já sentimos na pele: aumenta o desemprego, os postos de trabalho – em especial para a juventude – oferecem salários menores e está mais difícil pagar as contas no fim do mês.
As origens históricas da manutenção da taxa de lucro financeira do Brasil não são simples resultado da “eficiência empresarial de tal setor”, mas sim do resultado de uma organização política e econômica, que envolve diretamente o Estado brasileiro. Não temos dúvidas que se trata de um setor que recebeu privilégios econômicos nos últimos anos.
É possível ver de cara como os bancos detém poder, não só financeiramente, mas também pelo financiamento de campanhas, pelas indicações de executivos para ocupar cargos estratégicos no Banco Central, Ministério da Fazenda, Tesouro Nacional e inclusive em agências reguladoras, o que parece muito estranho, afinal qual o sentido de os bancos indicarem quem fiscaliza os seus movimentos.
Não é novidade que as opções de política econômica escolhidas sistematicamente pelos governos brasileiros até hoje, sempre estiveram de acordo com os interesses bancários, com a justificativa de que um sistema financeiro sólido é base para a estabilidade econômica. O discurso que é martelado diariamente na mídia sobre a necessidade de sanar as contas do governo, tem como resultado o conjunto de reformas propostas e aprovadas pelo desgoverno Temer. A justificativa é exatamente a de que não se tem dinheiro para cobrir os gastos do governo como um todo, e ainda arcar com o pagamento de juros e amortizações da dívida pública federal, que é a prioridade do governo. O movimento é mais ou menos o seguinte, se reduz todos os gastos para fabricar um superávit primário (que nada mais é do que a diferença entre a arrecadação e gastos do governo sem contar os juros da dívida), impondo sacrifícios sociais para reservar dinheiro para o pagamento dessa tal dívida.
Essa dívida é fabricada pela emissão de títulos em nome do governo federal, com a garantia de pagamento de juros depois de um período específico. E quem é que detém os títulos da dívida pública brasileira? Você sabe onde é possível comprar um título? Em 2017, os bancos brasileiros detinham 20% dos títulos, cabendo outros 50% a fundos de investimento e fundos de pensão[3], ou seja, todos protagonistas do setor financeiro.
A dívida brasileira chegou no fim de 2017 ao valor de pouco mais de 5 trilhões de reais, e o Estado brasileiro desembolsou 2,7 bilhões de reais por dia para pagamento de juros[2] e amortizações da dívida pública federal, em um total de mais de 1 trilhão e 130 bilhões de reais [4]. Porque fazer essa dívida? Como vem sendo anunciado, desde 2014 o governo não fecha o caixa, e acaba emitindo nova dívida para sanar as suas contas, só que em um período de crise econômica, como o de hoje, os compradores de títulos precisam de taxas de juros que valem a pena, e o governo acaba emitindo títulos com taxas impostas por esses setores, o que acaba se tornando um círculo vicioso: O governo emite títulos para obter dinheiro para pagar as contas, mas a sua maior conta é a própria dívida que ele emite. O resultado é um Estado submisso ao pagamento de juros dessa dívida com poucas condições de diminuir o seu valor real, um sistema muito similar a conhecida agiotagem.
Como é possível que o governo de um país proponha um teto para gastos em educação, saúde e segurança pública para os próximos 20 anos, proponha uma reforma trabalhista criminosa que tem como missão retirar direitos dos trabalhadores e uma reforma previdenciária que ameaça o futuro de inúmeras gerações de brasileiros com a justificativa de sanar as contas federais, e não propõe maneiras de diminuir o arrombo provocado pelo pagamento da dívida pública?
Embora o que falamos acima seja alarmante, a bonança não acaba no sistema da dívida, os bancos brasileiros têm como carros chefe para os seus altos lucros uma política de juros exorbitante e o segundo maior spread[5] bancário do mundo, e sim, ao contrário do sistema da dívida, isso atinge diretamente os trabalhadores brasileiros. Esses juros tem como base a taxa de juros básica que pode ser orientada pelo Banco Central, a famosa SELIC, mas na verdade, a sua determinação ultrapassa esse limite, e o trabalhador está submetido a eles para tomar empréstimos, pagar a fatura do cartão que atrasou, financiar a casa, o carro e etc.
Inclusive, no Brasil, caso o trabalhador deixasse de pagar a fatura de cartão de crédito, em 2017, ele pagaria em média 352, 76% ao ano em juros.[6] Fica fácil entender porque os bancos e o setor financeiro como um todo são ativos na política econômica. O resultado disso tudo é um só: uma aceleração sem precedentes do processo de concentração de renda e a garantia da manutenção de privilégios no país.
É preciso de uma vez que o governo seja de fato do povo. Para tal precisamos de uma atuação ativa do Estado sobre a economia com a intenção clara de promover o desenvolvimento, a geração de empregos e a distribuição de renda com o compromisso claro de produzir baixo impacto ambiental. É preciso um país com instituições que funcionem e sejam fortalecidas e aliadas às necessidades das maiorias, daqueles que vivem do trabalho e dos oprimidos.
Nas eleições, alguns milionários apresentam uma repetição demagógica de planos econômicos desde a década de 1980, para favorecer o capital financeiro. Alguns são representantes legítimos desse setor, como o Henrique Meirelles (PMDB) e o João Amoedo (Novo). Outros são aliados desse projeto que favorece o lucro acima da vida e usam palavras como “eficiência” para justificar a retirada de direitos. Por isso, não temos dúvida: estamos com Guilherme Boulos e Sônia Guajajara! Começamos a campanha em um ato na frente da bovespa em São Paulo para denunciar os privilégios dos banqueiros. Conheça nossos eixos para mudar o Brasil:
A utilização dos bancos públicos para estratégia de desenvolvimento e não para servir interesses de algumas empresas ou setores;
Regulamentação financeira democrática que permita fiscalizar o comportamento abusivo dos bancos; auditar e fiscalizar a dívida pública; e defender a independência do Banco Central sim, mas não com relação ao governo e a estratégia de desenvolvimento, mas com relação ao mercado financeiro, acabando com a relação direta entre agentes de bancos privados nos bancos públicos, a famosa porta giratória.
A economia não pertence aos paletós e gráficos! É no programa de Boulos e Sônia, construído a muitas mãos e nas mobilizações de rua, que encontramos a possibilidade de seguir firme na luta contra os interesses do sistema financeiro e pela construção de uma economia mais democrática, de fato inclusiva e que possibilite abrir os caminhos de uma nova sociedade.
[3] Dados de Dez/2017 retirados do Tesouro Nacional
[4] Dados obtidos no site da Auditoria Cidadã da Dívida
[5] Basicamente é a diferença entre os juros que o banco paga ao tomar dinheiro emprestado e quanto ele cobra ao emprestar dinheiro.
[6] Para se ter uma ideia, na América Latina, o 2º país que mais cobra juros no crédito rotativo, esse da fatura no cartão, cobra menos de 50% ao ano.
(1)Estudante de Mestrado em Economia na UNICAMP e militante do Movimento RUA
(2)Conheça no site do TSE os candidatos milionários. O João Amoedo do NOVO declarou R$ 425.066.485,46. Henrique Meirelles do PMDB declarou R$ 377.496.700,70. Álvaro Dias, senador e candidato do PODEMOS, declarou R$ 2.889.933,32. Jair Bolsonaro do PSL, membro das forças armadas, declarou R$ 2.286.779,48. Geraldo Alckimin do PSDB declarou R$ 1.379.131,70. Eymael do DC, empresário, declarou R$ 6.135.114,71. Ciro Gomes do PDT declarou R$ 1.695.203,15. O João Goulart Filho do PPL declarou R$ 8.591.035,79. O Lula do PT declarou R$ 7.987.921,57.