É necessário sempre acreditar que o sonho é possível
Que o céu é o limite e você, truta, é imbatível
Que o tempo ruim vai passar, é só uma fase
Que o sofrimento alimenta mais a sua coragem
Esse trecho dos Racionais foi a reflexão mais tardia, já chego nele. De início, na verdade, minha mente viajava sobre a inconformidade do “nada mudou”, então lembrei de “500 anos de Brasil e o Brasil aqui nada mudou - outro trecho pedrada.
A inconformidade com as condições atuais me faz questionar as nossas bases - brasileiras, periféricas- e me movimentar a sair da mesmice de respostas. O problema é que o sufoco se mostra mais antigo, mais enraizado do que gostaríamos. Talvez, se tratasse “apenas” desses longínquos quase três meses de isolamento e as consequências dele para as vidas das pessoas mais pobres, conseguiríamos apresentar, não sem esforços, saídas. Mas se em 500 anos de Brasil nada mudou, a covid veio para piorar bastante as coisas.
O dedo coça para começar uma exposição histórica da construção da desigualdade brasileira, um misto de “é necessário falar” com a “vontade de pontuar a inconformidade que revira o estômago”. Mas a fim de que você leia até o próximo parágrafo, penso que talvez seja melhor encurtar a história: Enfrentar a colonização, a escravidão, o genocídio de culturas, povos e saberes, tem tudo a ver com a saída que temos que apresentar para esse momento.
As coisas não serão iguais, a vida não vai voltar ao normal, porque o normal que construímos mata, aprisiona, destrói. A vida normal na verdade é fruto de uma sociedade profundamente adoecida. Sendo esse nosso cenário normalidade, aprendemos a dar respostas viciadas, que reproduzem essa mesma estrutura.
Não podemos deixar que se repita a crueldade que marcou a nossa história. Como diz a mensagem parte da música que eu iniciei o texto, precisamos de uma construção coletiva, favelada e periférica. Contrariando a meritocracia, apresentamos o “nós por nós”. Não há vitória que não seja coletiva, não há possibilidades de saídas individuais.
"O Brasil precisa ser dirigido por alguém que já passou fome”, disse Carolina Maria de Jesus. Talvez, não só o Brasil.
“Todo problema humano exige ser considerado a partir do tempo. Sendo ideal que o presente sempre sirva para construir o futuro.” (Frantz Fanon)