O dia 15 de maio marcou o aniversário de um dos episódios mais importantes da história do povo palestino. É a nakba - que poderia ser traduzida para o português como "catástrofe" -, episódio que culminou com a morte de pelo menos 10 mil pessoas e a expulsão de cerca de 60% da população palestina de suas casas, em decorrência da criação colonial do Estado de Israel na região, em 1948. Por meio de um processo premeditado de limpeza étnica, vilas palestinas inteiras foram eliminadas, gerando o maior número de refugiadas e refugiados da história mundial até então.
É importante ressaltar, no entanto, que o processo de colonização da Palestina não começa e não termina com a nakba. Desde o início do século XX, colonos sionistas foram se instalando na região, com a anuência e o apoio do mandato britânico, que detinha formalmente o controle da Palestina histórica desde o fim da I Guerra Mundial. Depois de 1948 e do estabelecimento do Estado de Israel, o processo de limpeza étnica se manteve, através de políticas sistemáticas de demolição e remoção forçada de casas palestinas, controle e restrição do acesso palestino à água e à terra, expansão de assentamentos judaicos na Cisjordânia - que têm como objetivo “facilitar” e legitimar uma futura anexação formal desses territórios por parte do estado sionista - dentre outras.
A essa série de políticas coloniais se somam, mais recentementemente, medidas de aperfeiçoamento dos sistemas de controle da sociedade civil palestina por parte de Israel: como a criação de "checkpoints" (postos de controle nos quais palestines são submetidos a processos de humilhação por soldados israelenses ao se deslocarem por territórios militarmente ocupados), a construção de um muro ilegal na Cisjordânia, o amplo encarceramento da população palestina (que inclui prisões ilegais de crianças) e o estabelecimento de um sistema de apartheid, no qual palestinas e palestinos, vivendo dentro do que hoje é o Estado de Israel, são superexplorados e privados de uma série de direitos políticos, civis, sociais e econômicos - aos quais apenas os judeus israelenses têm acesso.
Não se trata, portanto, de um conflito entre dois lados simétricos, e muito menos de um conflito religioso - como a mídia hegemônica frequentemente argumenta -, mas sim de um processo de ocupação colonial que se mantém até os dias de hoje por meio de um sofisticado sistema racista de controle de pessoas, anexação de territórios e da manutenção de um regime de apartheid que, infelzimente, segue contando com amplo apoio internacional.
Em 2021, o aniversário da nakba é relembrado em meio a uma escalada de violência na região. No meio do Ramadã - mês sagrado para os muçulmanos - famílias palestinas que vivem no bairro de Sheik Jarrah, em Jerusalém Oriental, têm enfrentado o aumento da violência de colonos e da polícia israelense, que procuram forçar o deslocamento dessas famílias e removê-las de suas casas. Esta escalada na violência contra palestines se alastrou para diversos tipos de conflitos nas últimas semanas: incluindo invasões à mesquita de Al Aqsa, destruição de comércios palestinos, linchamentos de palestinas e palestinos nas ruas por colonos israelenses de extrema direita e o bombardeio de Gaza que provocou, até a publicação deste texto, a morte de mais de 200 palestines, dos quais pelo menos 50 eram crianças.
Embora pareça uma realidade distante, nossas lutas aqui no Brasil se conectam profundamente com a luta do povo palestino por liberdade e pelo direito de viver no seu território. Há muitos anos, os governos brasileiros mantém uma cooperação militar com o regime israelense e importam armamentos e tecnologias de segurança que são "testadas" sobre palestinas e palestinos, para depois reprimir movimentos sociais, encarcerar e exterminar corpos negros, favelados e indígenas no Brasil. Ao ocupar e colonizar os Territórios Palestinos, Israel desenvolveu um verdadeiro laboratório de tecnologias de repressão e controle social de corpos, muitas das quais são utilizadas no nosso país. Não à toa, Israel - governado há anos pela extrema direita - se mantém como um dos principais aliados do governo Bolsonaro.
A conexão das nossas lutas com as do povo palestino é essencial para a superação de sistemas opressores, fundamentados no racismo e no colonialismo. Se as fronteiras nacionais servem apenas para a consolidação dos poderes do capital, é nosso dever internacionalizar a resistência, em direção à libertação de todos os povos que enfrentam diariamente a violência racial que sustenta o capitalismo. Acreditamos que a luta anticapitalista é necessariamente anti-colonial, antirracista e internacionalista. Por isso, desde o Brasil, afirmamos nosso repúdio à escalada recente de violência contra as e os palestinos, manifestamos nosso apoio ao fim da ocupação racista e colonial israelense, e ao processo contínuo de limpeza étnica que persiste na Palestina há quase um século. Defendemos a auto-organização e resistência de todas e todos os palestinos mundo afora, bem como seu direito de retorno e de autodeterminação. Toda a solidariedade à luta do povo palestino!
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