Estamos passando pela maior crise dos últimos cem anos - essa crise é de ordem sanitária, econômica, ambiental, política e social. O estado de pandemia ocasionado pelo coronavírus, escancara todas as contradições existentes na nossa sociedade. O nosso país lamenta as mais de 500.000 vidas perdidas nessa tragédia e responsabiliza o Governo Bolsonaro por apresentar um projeto genocida de defesa dos lucros acima da vida de milhares de brasileiros.
A violência cotidiana que o patriarcado e o capitalismo exercem sobre os nossos corpos, torna o enfrentamento a COVID-19 um desafio muito mais árduo para nós mulheres. O trabalho historicamente e socialmente construído para as mulheres foi o trabalho do espaço privado- o cuidado do lar e dos outros -, que garante a reprodução e manutenção social e que é um trabalho não remunerado. Durante a pandemia houve uma intensificação dessa lógica. Para as mulheres que estão trabalhando e/ou estudando de casa, a vida fora e dentro de casa se misturou. E mesmo para as mulheres que seguiram saindo de casa cotidianamente, houve intensificação da sua jornada, devido ao aumento das tarefas domésticas, à precarização da vida e à necessidade de cuidado de pessoas doentes.
Ao mesmo tempo, o isolamento social representa e os altos índices de desemprego, representam uma exposição maior das mulheres à violência de gênero, pois esta ocorre principalmente pelas mãos de companheiros e ex-companheiros nas suas próprias casas. Durante o período de quarentena, vários estados registraram aumento nas agressões às mulheres. O 14º Anuário Brasileiro de Segurança Pública atestou um crescimento de 2% dos feminicídios em todo o Brasil em 2020, chegando a 14% em alguns estados.
Enquanto nossas condições de vida pioraram e os índices de violência contra nossos corpos cresceram, Bolsonaro mantém sua política de morte, afirmando que era preciso apenas “postura” - e não investimento público - para enfrentar a violência doméstica. Em 2019, o presidente zerou o repasse para o Programa de Casas da Mulher Brasileira e contribuiu para a redução de R$ 34,7 milhões, em 2015, para apenas R$ 194, 7 mil, em 2019, de recursos destinados aos serviços que atendem mulheres em situação de violência. Durante a pandemia, o governo não apresentou nenhuma medida para combater a violência doméstica.
O Governo Bolsonaro e o ministro da economia Paulo Guedes, são um desastre na política econômica, pela primeira vez desde 2012, menos da metade dos brasileiros em condições de trabalhar estão de fato trabalhando. Segundo dados do IBGE aproximadamente 7,8 milhões de pessoas deixaram de fazer parte da população ocupada em 2020. É como se todo mundo que mora na cidade do Rio de Janeiro perdesse o trabalho. Para cada 100 pessoas que tinham emprego no trimestre anterior, apenas 92 continuaram empregadas. Em fevereiro de 2021 o Brasil registrou um índice de desemprego histórico chegando a 14,4% de desempregados. Ainda, segundo o DIEESE, as mulheres foram as mais afetadas pelo desemprego na pandemia, em especial as mulheres negras. Além disso, o preço dos alimentos, da luz, do gás subiu muito, trazendo o Brasil de volta ao mapa da fome e colocando milhares de famílias em insegurança alimentar. A responsabilidade de lidar com essa situação, mais uma vez, afeta mais as mulheres, que no geral são as responsáveis pela economia doméstica.
Os abusos sobre as mulheres negras são ainda mais arbitrários, a sociedade brasileira carrega resquícios escravocratas e o local de subalternização dessas mulheres é ainda mais intenso e violento. Não é atoa que a primeira vítima de COVID-19 no Estado do Rio de Janeiro, foi Cleonice Gonçalves, mulher negra de 63 anos que era diarista. Ela morreu em Miguel Pereira, a 120 quilômetros da capital, mas foi contaminada no Leblon, onde morava a patroa. Existem tantas Cleonices de norte a sul do País e as queremos vivas! Um estudo realizado pelo Núcleo de Operações e Inteligência em Saúde da PUC Rio, com dados de 30 mil pacientes fornecidos pelo Ministério da Saúde até 18 de maio de 2020, revela que 54,78% das pessoas pretas e pardas infectadas pelo vírus vieram a óbito, enquanto entre brancos essa taxa é de 37,93. Sabemos que a letalidade do vírus também é maior para os moradores que vivem em assentamentos precários, sem saneamento e sem direitos básicos, até o mais evidente que é ter o direito à água para alguns é negado – No Brasil, uma de cada sete casas não está ligada à rede de água. No total, são 9,6 milhões de residências sem água na torneira. Equivalente aos estados do Rio de Janeiro e de Pernambuco, juntos.
Dentro dessa lógica de negação da vida percebemos que o Brasil vive sob duas epidemias: a do coronavírus e a dos homicídios. O projeto de genocídio da população preta e indígena do Brasil se intensificou na pandemia. E são os filhos e filhas de diversas mulheres que continuam morrendo vítimas da política de segurança pública brasileira. A morte do menino, João Pedro, no Rio de Janeiro, que tinha 11 anos, e do Mizael Fernandes da Silva, de 13 anos, no Ceará, mostram que nossas crianças estão morrendo e sendo vítimas da violência policial. A chacina de Jacarezinho, a maior da história do Rio de Janeiro, assim como os diversos ataques às populações indígenas durante a pandemia também são parte desse mesmo projeto.
Após um ano e meio de aulas remotas, ficou evidente o quão desafiador tem sido a implantação e acompanhamento dos ensino nas universidades. Presenciamos nas mais diversas Instituições de Ensino Superior, esse debate da implementação do ensino remoto, e agora vemos algumas faculdades apresentarem como solução o retorno presencial das aulas sem um plano sanitário, político e pedagógico eficiente. A realidade das mulheres estudantes têm particularidades. O acúmulo de trabalho, a precarização da vida, a maior responsabilização pelas tarefas domésticas e de cuidado, como já dissemos, atinge mais as mulheres, o que dificulta ainda mais uma adaptação ao sistema de ensino remoto.
Por isso nós, mulheres estudantes, acreditamos que é fundamental esse debate de implementação de aulas online ou retorno presencial seja feito de forma democrática, com ampla participação de toda a comunidade acadêmica - professores, estudantes e técnicos-administrativos. Avaliando os possíveis impactos negativos dessa decisão, para tentar diminuí-los. Destacamos ainda que as consequências dessa decisão são sentidas de forma diferente para aquelas que são mulheres, negras e negros e LGBTs. Além disso, com a crescente precarização da vida imposta pela crise, o debate de permanência estudantil se faz ainda mais urgente.
Sabemos que o projeto de morte de Bolsonaro também é um projeto de precarização das universidades públicas. Temos visto ataques à autonomia universitária, cortes enormes de verbas e o desmonte da educação pública que está afetando ensino, pesquisa e extensão.
Esse encontro, então, é um importante espaço de acúmulo e organização para que possamos avançar na luta por universidades que durante e depois da pandemia, sejam mais democráticas, com políticas de permanência que levem em consideração a realidade das mulheres, das LGBTS, das negras e negros. Que as instituições construam junto com a comunidade universitária a forma de continuação do ensino remoto ou retorno ao presencial.
Para avançarmos é necessário e urgente que enfrentemos o Bolsonaro e o Bolsonarismo.
Convidamos todas as feministas universitárias de norte a sul do Brasil, para construir esse encontro e pensar coletivamente sobre essas questões, vamos de mãos dadas! Venha participar dessa construção!